Pedagogia do oprimido versus pedagogia dos conteúdos

Autor: Tomaz Tadeu da Silva
Título: Documentos de identidade - uma introdução às teorias do currículo
Editora: Autêntica
Ano de Publicação: 2003

O autor inicia o capítulo conceituando historicamente as obras de Paulo Freire, Educação para a prática da liberdade (1967) e Pedagogia do Oprimido (1970). Nesse texto, de maneira particular, vamos tecer comentários a respeito da segunda obra citada.
Em Pedagogia do Oprimido Freire trás uma análise do processo de dominação que está no bojo das relações pedagógicas. Também trás uma análise das criticas sociológicas da educação institucionalizada nos países desenvolvidos.
Freire mostra o conceito de educação bancária expressa numa visão de conhecimento constituído de informações e fatos que podem ser simplesmente transferidos do professor para o aluno. Nesse sentido, o conhecimento é algo que existe de fora para dentro independentemente do sujeito e sua subjetividade.
Numa perspectiva fenomenológica, pois, não há como separar o ato de conhecer e aquilo que se conhece, Freire apresenta o conceito de “educação problematizadora”. Nesse sentido, Freire busca desenvolver uma concepção que possa se constituir numa alternativa à concepção bancária que ele critica (pg. 59).
Na visão de Freire o ato de conhecer não é isolado e individual. A intercomunicação está presente no ato de conhecer, e é mediada pelos objetos a serem conhecidos. Assim, o ato pedagógico se torna dialógico.  Nessa perspectiva, todos os sujeitos estão envolvidos no ato de conhecimento, e educador e educandos criam dialogicamente, um conhecimento do mundo.
O conceito de “educação problematizadora” norteia a proposta de um currículo onde está presente elementos do currículo tradicional. Por exemplo: conteúdos programáticos. Porém, Freire se mostra diferente na forma como se constroem esses elementos.
Nessa concepção diferenciada de currículo, é a própria experiência dos educandos que se torna fonte primária de busca de temas significativos que vão construir o conteúdo programático. E ainda, Freire reforça a importância dos especialistas e educadores que estão próximos dos educandos no sentido deles serem os indivíduos responsáveis pela organização do currículo desestruturado que deverá ser buscado na realidade dos interessados, ou seja, os educandos.
Sobre essas bases, ainda, Freire destaca em sua epistemologia a idéia de “conceito antropológico de cultura”. Nessa concepção de “culturas” não se distingue cultura popular de cultura erudita. A cultura é o resultado de qualquer trabalho humano. Essa ampliação do que seja cultura permite a Paulo Freire desenvolver uma perspectiva curricular que extingue as fronteiras entre cultura popular e cultura erudita. Assim, a chamada “cultura popular” é convidada a fazer parte do currículo.
Essa antecipação cultural sobre currículo caracterizou uma pedagogia pós-colonialista, onde, buscou-se problematizar as relações de poder entre os países colonizadores e os colonizados.
O predomínio de Paulo Freire no campo educacional brasileiro foi contestado no inicio dos anos 80 pela “pedagogia histórico-critica” desenvolvida por Demerval Saviani.  Para este ultimo autor a educação deve ser separada da política. Para ele, “uma prática educacional que não consiga se separa da política perde sua especificidade” (pg. 63).  Existe na teoria de Saviani uma nítida união entre conhecimento e poder.
A teoria de Saviani se opõe à pedagogia libertadora freiriana, porém, cumpriu um importante papel nos debates do campo critico do currículo e continua tendo a sua  importância.

Apreciação Critica:

Percebo que essa obra clássica de Paulo Freire nos apresenta uma teoria critica da pedagogia com bastante relevância quando conceitua a “educação problematizadora”, o “conceito antropológico de cultura” e a critica à “educação bancária”. Esses conceitos articulados formam uma teoria que tem como objetivo contestar uma pedagogia tradicionalista e que tem o ideal de educação como àquele que dá voz às classes dominantes e seus interesses políticos e culturais.
O contexto das “culturas”, que Freire trás à tona, aviva as diversas manifestações culturais que existem entre nosso povo como sendo aquelas que poderão nortear novos temas curriculares. Nessa concepção de cultura e educação a organização do currículo escolar ganha nova forma e significado, tornando-se significante para aqueles que o vivenciam.
Ainda, entendo que já faz tempo que Paulo Freire problematizou todas essas questões, mas a idéia de educação bancária tenta resistir ao tempo nos diversos contextos escolares onde os educadores ainda tentam ver os educados como sujeitos passivos do processo educativo, não lhes dando espaço para o manifesto curricular que emerge de suas realidades.



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